
Por Norma Leite Aquilino
Falar sobre a mulher contemporânea, de sua ação na sociedade moderna, é falar de muitos papéis, exercidos, nem sempre, como outrora o foram. A mulher de hoje, além de mãe, esposa, filha, é estudante e profissional. O mercado de trabalho exigiu sua presença, num determinado momento desse século. Ela respondeu a esse apelo, parece ter gostado e....não mais que de repente viu-se abraçando inúmeros papéis, muitas vezes sem a infra-estrutura necessária para tal.
Ao lado de tudo isso, vale lembrar:a mulher de hoje precisa, mais do que nunca, cuidar de sua aparência física, estar disponível e encantadora para seu companheiro, mostrar-se bem informada sobre o que acontece... A mídia lhe diz isso a todo instante....de forma torturante e eficaz.
Esse novo comportamento, se lhe traz satisfação, traz, também, ansiedade e várias seqüelas referentes à saúde. Ansiedade porque continua desejando ou precisando cumprir as tarefas que sempre lhe couberam, as funções pertinentes à casa, à família...Seqüelas em relação à saúde porque, num mercado de trabalho acirrado, defronta-se com todos os males que, no passado, foram “privilégio” do mundo masculino: a competição, a disputa pela autoridade, o cansaço na correria diária, a batalha pelo sustento familiar.
Sua luta, porém, não termina ao chegar em casa. Nesse espaço, após um dia longo e sacrificado, essa mesma mulher tem diante de si questões práticas e emocionais a serem resolvidas. Questões que lhe trazem culpa, preocupação constante...em alguns momentos pergunta-se: darei conta? Em inúmeros momentos sente-se só, com o mundo em seus ombros.
A grande pergunta parece ser: valeu a pena sair em busca da independência? Ainda que, no princípio de tudo, esse “ir à luta” significasse necessidade? Valeu a pena ter “tomado o gosto” pelo direcionamento de sua própria existência?
Impossível deixar de fazer referência ao grande poeta português:
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador,
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
Fernando Pessoa in Mensagem
O texto parece dizer tudo. Não há conquista sem dor, desafio sem momentos de insegurança, de falta de chão. Como reconstruir um novo papel sem perder o comando de outras funções exercidas? Impossível. Essa mulher precisa, ainda, aprender em sua plenitude o significado da palavra delegar. Delegar a seu parceiro de caminhada, a seus filhos algumas tarefas. Reconhecer que uma parte de seu sentimento de angústia e frustração tem origem na falsa premissa de que “só ela dá conta” dos afazeres diários é o começo de tudo. Conscientizar a família de que a manutenção da casa depende um pouco de todos que nela habitam, é ensinar a seus filhos a vida em comunidade. Dividir com seu parceiro tarefas cotidianas é dizer a ele que essa mulher é falível, tem limitações. Não, o mundo não precisa, nem deveria estar sobre seus ombros. A não ser que assim ela o deseje...inúmeras vezes isso ocorre, ainda que de forma inconsciente, na grande parte das mulheres...fruto de um passado em que homens e mulheres tinham papéis independentes e complementares e buscavam suprir, sem onerar o outro, suas carências.
A mesma mulher necessita, também, ter em mente, algumas questões em relação ao mundo profissional. É da observação dos fatos do passado que retiramos lições. Por que repetir o caminho trilhado pelos homens? Aquele caminho que lhes tirou a saúde, o bom-humor? Por que não buscar no trabalho o prazer real, através de uma prática menos competitiva e mais participativa? Ah, dirão os mais céticos: “Isso é impossível...a luta pelo emprego está difícil...”
Nesse momento, vale lembrar algumas características importantíssimas desse dito sexo frágil: a intuição, a flexibilidade, a criatividade, a perseverança, o navegar em diversas áreas...dizem, os especialistas, que são as qualidades essenciais no mundo do trabalho atual.... Será que de posse de todos esses elementos, a mulher não tem condições de alterar o paradigma até então vigente? Não terá ela, ao lado dos homens, parceiros de caminhada, um papel fundamental? Não terá ela chegado ao universo masculino para somar, acrescentar tudo aquilo que, ao longo de sua trajetória como mãe e esposa, aprendeu? O saber ouvir...o buscar partilhar os diferentes pontos de vista... a sensibilidade para perceber e reunir o que há de melhor em cada um?
Ficam as perguntas....as respostas, só o tempo as responderá...Dizem que para conhecer nosso passado e nosso presente necessitamos de boas perguntas...que nos façam ir em busca das repostas para compreender nosso tempo. Diante disso, talvez fosse importante deixar a essas mulheres do passado e do presente os versos daquele que sabiamente as representava:
E aprendi que se depende tanto,
de tanta muita diferente gente,
toda pessoa sempre é as marcas
das lições diárias de outras tantas pessoas.
É tão bonito quando a gente sente
que a gente é tanta gente
onde quer que a gente vá
É tão bonito quando a gente sente
que nunca está sozinho por mais que pense estar.
É tão bonito quando a gente pisa firme
nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos.
É tão bonito quando a gente vai à vida
nos caminhos onde bate bem mais forte o coração.
Gonzaguinha – Caminhos do coração
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